quinta-feira, maio 11, 2006

Estória de um Sábado

Ao Sábado de manhã ela cumpria escrupulosamente o seu ritual de libertação do stress do dia-a-dia. Apanhava o cabelo, vestia uma roupa qualquer, descia as escadas e ia comprar o jornal, regressava a casa, descalçava-se, punha o pijama, preparava alguma coisa para comer, sentava-se a ler o jornal e a tomar o pequeno-almoço. Pelo menos há um ano que era assim.
Envolta no seu mundo, lá lia as notícias sobre a Colecção Berardo, os investimentos do Patrick Monteiro de Barros, enfim, as notícias do seu país, não o que ela sonhava mas o que tinha efectivamente. Naquela manhã, a campainha da porta tocou, interrompendo-lhe a leitura e assustando-a, afinal isto de viver sozinha tem destas coisas, às vezes não se está à espera de ninguém.
Abriu a porta e à sua frente estava o Pedro. Não o via há um ano. Ele olhou-a nos olhos e disse: "Bom dia! Estás boa?"
Ela sorriu-lhe, e naquele instante passaram-lhe pelos olhos, a história da vida dela do último ano, o dia em que ele se tinha ido embora "à procura de se conhecer melhor", as lágrimas, o vazio, a solidão, as noites em claro a perguntar-se porquê. "Estou bem, Pedro".
"Vim porque sinto a tua falta"

"Mas eu não sinto a tua".
Fechou a porta, sentou-se à mesa, agarrou no jornal mas não conseguia ler. As lágrimas escorriam-lhe pelo rosto abaixo e iriam continuar até que ela conseguisse limpar todos os sentimentos que a inundavam nesse momento. Finalmente um sorriso despontou no seu rosto, no fundo ela sabia que no próximo Sábado, iria alterar o seu ritual de espera por um novo ritual, o ritual da esperança.

9 comentários:

Anónimo disse...

Sheet, Isto não é o secret diary of Adrian Mole, mas o secret diary of Adrian Maria.

Maria, da minha curta experiência de blogs, e de ler o teu, este foi o teu post para mim mais profundo, o mais pessoal, o mais intimo………

Fez-me reflectir, não sei se eu conseguiria perdoar e aceitar de volta alguém, que tirasse um ano fora para se procurar, ia ter com certeza muita vontade de castigar essa pessoa, caso isso tivesse causado grande sofrimento, e até lhe podia responder que não tinha sentido falta, apesar de ser a pessoal que mais falta fez, mas por outro lado e caso fosse apenas uma questão de orgulho, não sei até que ponto resistiria a não perdoar. (não quer dizer aceitar de volta), mas isso sou sem duvida eu, com a minha lógica pessoal e com os meus sentimentos, cada um lida com os seus à sua maneira bem própria., já aprendi que não vale a pena impingir a nossa lógica a ninguém….

Outra reflexão que tenho, é a de que não basta nós querermos para deixarmos de gostar de alguém, por vezes gostamos de alguém que não queremos, que nos é altamente prejudicial e causa sofrimento gostar desse alguém, mas mesmo assim, e mesmo com essa consciência não conseguir deixar de gostar….

Isto até pode nem fazer sentido nenhum, não sei mais nada alem do que está escrito no original post, e nesse caso sou só mesmo eu a abusar do teu blog para as minhas reflexões

Qual é o ritual da esperança? E esperança de que? Podes partilhar ou é demasiado íntimo?

smile disse...

Um ano é muito tempo. Ou então um ano é pouco tempo. Quando se trata de feridas de amor, o tempo é algo absolutamente relativo, pois podemos passar muito tempo a curar-nos de alguém mas, se algo acontece, a ferida volta a sangrar muito mais rapidamente que da vez anterior... E muitas vezes não importa se foi um ano, quize dias ou uma vida...

http://omeureduto.blogspot.com/ (novo)
http://tascatimanel.blogspot.com/

Salta Pocinhas disse...

Bom dia!
Nao vou comentar o post porque já sabes o que escreveria ;)
Beijinhos

LoiS disse...

Comento eu:

Pó car*** ! um ano !!!

Falta-lhe uma companhia preferencial mas tem o reduto, a controlada, a manietada à espera!

Farta-se de alguém, vai dar umas por fora, lá fora fartam-se dele, sinte-se só, então regressa à "base", até voltar de novo a fazer o mesmo !

Desculpem o meu lógico pragmatismo !

Maríita disse...

É extraordinário como toda a gente assumiu que este post era sobre mim, não é, nem tem semelhança com nada que eu esteja a viver neste momento da minha vida.

Mangas,
Quando eu tiver tempo escrevo algo sobre o ritual de esperança, mas isto com o telefone a tocar de cinco em cinco minutos é impossível.

Salta Pocinhas,
Podes escrever o que quiseres, já ontem te disse o que era o post, um exercício de escrita.

Lois,
É exactamente isso, as pessoas que vão "à procura delas" e acham que o mundo permanece imutável.

P.S. - Se ouvirem o "Drops of Jupiter" entendem bem de onde é que surge esta ideia

Anónimo disse...

heheheh Maria

Sim, pensei que se tratava de ti, sabes quando um amigo vem com uma historia de que tem uma amigo a quem a conteceu algo, e nós ficamos com a sensação que está a falar dele próprio?

pois foi o que eu pensei

Olha o Lois já voltou do Puorto

Maríita disse...

:) Eu sei meu querido, mas já não é a primeira vez que publico aqui um texto fictício, agora é claro, muitos daqueles sentimentos já os vivi.

Claro que sei que o LoiS já cá está, ontem já lhe estive a melgar a cabeça...

Andorinha disse...

Bom exercício linda! Pra início de conversa convenceste uma data de gente do realismo do mesmo. Até eu própria, não fosse o caso de ter a mania de cuscar os comments dos outros! lol

De qq forma, não deixa de ser um bom exercício tb para pensar: e se fossemos a personagem da história. Eu nunca seria por uma única razão - não sou rotineira em nada, nem na compra do jornal! ;))

Mas gosto especialmente da última mensagem, não fosse eu mulher: no próximo Sábado, iria alterar o seu ritual de espera por um novo ritual, o ritual da esperança.

"Hope is a good thing, maybe the best of things, and no good thing ever dies!" (Condenados de Shawshank)

Eva Shanti disse...

"...iria alterar o seu ritual de espera por um novo ritual, o ritual da esperança."

É profunda esta frase, mas eu preferia o ritual da mudança: todos os Sábados ter o desafio de fazer algo novo, diferente.

Bjs