terça-feira, fevereiro 28, 2006

Jardin Mogador

Da rua via-se apenas uma pequena porta de madeira pintada de verde com a indicação que se estava perante uma loja de chá. Se a pessoa fosse apressada não via aquela lojeca, nada chamaria a atenção para o leque de aromas que existia lá dentro.

Ao passar a porta, ela viu-se ladeada de armários e mesas que formavam um corredor, mas que desembocavam num espaço amplo com uma luminosidade especial que da rua não era visível ou sequer imaginável.
Ao fundo numa mesa redonda encontrava-se sentado um homem asiático, daqueles homens a quem não se consegue atribuir uma idade precisa, talvez nem sequer aproximada, estaria entre os 60 e os 70, um intervalo lato mas que para esta história serve.

O homem dirigiu-lhe um sorriso e perguntou-lhe em que a podia ajudar. A medo ela balbuciou umas palavras que sabia não fazerem nexo, o homem sorriu mais uma vez e estendeu-lhe uma chávena de chá, ela cheirou o chá, e encolheu-se, cheirava a remédio. Ninguém quer provar um chá que cheira a medicamento, mas o homem sorriu-lhe de modo tranquilizador, e ela sorveu o chá para ser surpreendida por um sabor que nada tinha que ver com o cheiro e sentiu-se inundada por uma tranquilidade enorme.

Neste novo estado, ela voltou a pedir-lhe um chá, um chá que a transportasse para outros locais, longe da cidade, um ambiente tranquilo, um jardim, algo que apelasse aos sentidos, ao seu lado sensorial que na lufa-lufa do quotidiano, ela mantinha escondido, oculto, como se da sua personalidade só fizesse parte a sua capacidade de trabalho e de resolução de problemas.

O homem olhou-a de cima a baixo, dirigiu-se a uma prateleira e retirou uma lata grande de chá e disse-lhe que infelizmente, os chás que permitiam os sonhos eram muito caros. Ela sorriu-lhe pela primeira vez desde que tinha chegado à loja, felizmente o dinheiro não era um problema, problema era ela não ser capaz de libertar as suas sensações, de mostrar a sua sensualidade e viver.

Munida do seu “Jardin Mogador” ela regressou a casa e conseguiu passar a viajar por locais de uma beleza indescritível onde o tacto, o olfacto e o paladar tinham um papel preponderante.

Há quanto tempo não usas os teus sentidos?

3 comentários:

Anónimo disse...

Maria davas uma boa escritora de romances! :)
Beijo

LoiS disse...

Realmente nem tudo o que parece é!
Excelente Post Marie...ao teu nível !!!!;)

Andorinha disse...

Gostei. Muito. O texto está divino.
Uso cada dia mais os meus sentidos pra captar aquilo que faz mexer as minhas emoções. É assim que renasço constantemente, e me recupero lentamente, e volto a ser quem fui, não deixando de ser quem sou.
Uso o cheiro pra captar o cheiro a maresia e transportar-me aos meus momentos de paz e tranquilidade nos veleiros; uso o tacto pra sentir a areia entre os dedos quando faço anjos de "neve" deitada na areia fina da praia; uso o olhar qdo quero revelar alegria ou tristeza, ternura ou desprezo; o paladar qdo como algo e me lembro de especiarias e países q visitei; e a audição pra me deixar transportar pela música e pelos sons que oiço lá fora, e que oiço dentro de mim e me permitem descobrir melhor quem sou. Todos em conjunto permitem-me sentir tranquila e em paz.
Beijos